Terceiro webinar: debatedores discutem saídas tributárias para crise social
Quarenta e três por cento da renda do Brasil está concentrada nas mãos de 10% da população, segundo o IBGE. Como agravante, 0,1% dessa população é dona de 30% das riquezas do país. Os números da desigualdade brasileira foram abordados no terceiro webinar promovido pelo Sindifisco Nacional, nesta sexta (8). Desta vez, a intenção foi discutir saídas tributárias para vencer a crise social. A videoconferência foi mediada pela jornalista do Estadão Vera Magalhães e teve como debatedores o presidente do sindicato, Kleber Cabral; a diretora-executiva da Oxfam Brasil, Kátia Maia; e o senador Plínio Valério (PSDB-AM).
Kleber explicou as “10 Medidas Tributárias Emergenciais”, propostas por entidades do Fisco brasileiro como possibilidades, no campo tributário, para reduzir os impactos da crise causada pela pandemia de Covid-19. Entre as propostas, ele destacou a isenção de tributos para micro e pequenas empresas do Simples Nacional, com a contrapartida da manutenção dos empregos; a fixação do câmbio para efeitos aduaneiros no valor praticado em 31 de dezembro de 2019; a desoneração das folhas de pagamentos com a retirada da obrigatoriedade de contribuição para o Sistema S; e a taxação de grandes fortunas.
Kátia Maia, que é socióloga, reforçou ser uma defensora do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) como medida capaz de contribuir para a diminuição das desigualdades no Brasil. Para ela, essas diferenças estão ainda mais evidentes nesse momento de crise. “As enormes desigualdades se escancararam. O enfrentamento da Covid-19 está sendo totalmente desigual. Não é toda a população que pode fazer isolamento e nem todo o mundo tem acesso a serviços de saúde”, pontuou.
A socióloga lembrou ainda que o IGF, previsto na Constituição de 1988, nunca saiu do papel. “Sempre é importante entender por que isso nunca foi implementado no Brasil. Quais são os interesses que fazem com que medidas aprovadas na Constituição e já praticadas por outros países capitalistas não sejam adotadas no nosso país? O IGF é algo urgente e necessário”, defendeu.
Sobre as críticas ao IGF e a argumentação de que ele geraria evasão de divisas, Kleber Cabral foi enfático: “Quando vejo pessoas criticando o IGF, eu me pergunto: para onde iriam os super ricos? O Brasil é um dos países mais condescendentes com os super ricos na tributação. É difícil encontrar um paraíso fiscal melhor do que o Brasil para eles”.
O senador Plínio Valério, que é autor de um projeto de lei sobre o IGF, representou no debate o estado do Amazonas, um dos mais atingidos pela pandemia. Ele avalizou o argumento de que não há risco de fuga de capital por causa de uma eventual aprovação do imposto. “Estamos falando em propriedades. Não dá para levar isso embora”, afirmou.
Reforma Tributária – Para Katia Maia, as “10 Medidas” seriam um primeiro passo para uma reforma tributária. Ela defendeu a simplificação dos impostos e a diminuição da carga tributária sobre o consumo para diminuir as injustiças sociais. Em sua avaliação, as medidas urgentes têm que ser norteadas por uma visão de futuro para criar um cenário favorável ao atingimento da justiça social.
Kleber ratificou a importância de um debate aprofundado sobre essa reforma. “A questão é a distribuição da carga tributária entre os brasileiros. Sobre as camadas mais pobres, recai uma carga tributária da Dinamarca. Mas elas não têm os serviços públicos da Dinamarca. Já entre os super ricos essa carga é extremamente baixa”, analisou.
O presidente do Sindifisco também avaliou as Propostas de Emendas à Constituição 45 e 110, em debate no Congresso Nacional, que tratam da unificação de tributos sobre consumo. “Isso é muito importante. Mas não é suficiente. Esses projetos ainda não tratam da redistribuição da carga tributária, ou seja, na necessidade de diminuir a tributação sobre consumo e aumentar o peso sobre renda e patrimônio. As nossas propostas tratam disso. Tem o IGF e a ampliação do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), que no Brasil é muito baixo”, criticou.
Plínio Valério defendeu uma reforma tributária que promova justiça fiscal. Nas palavras do senador, “o governo costuma ser leão quando trata com trabalhador que precisa comer. Mas é ovelha quando trata com os empresários, quem tem poder”.
No entanto, o parlamentar disse não estar otimista em relação a uma reforma tributária a curto prazo. “Não esperem tão cedo. Que proposta vai ser debatida: a da Câmara ou a do Senado? O governo ainda não apresentou nenhuma proposta”, afirmou.
Ele defendeu o trabalho de convencimento técnico, como vem fazendo o Sindifisco, para embasar parlamentares sobre o que precisa ser feito, a fim de se atingir a justiça fiscal.
Kleber Cabral lembrou que cinco das dez medidas sugeridas pelas entidades do Fisco já viraram projetos de lei, apresentados pelo deputado Celso Sabino (PSDB/PA). O presidente do Sindifisco também destacou que os Auditores-Fiscais defendem mudanças no imposto de renda e a taxação de lucros e dividendos, temas que ficaram de fora das “10 Medidas” por possuírem estas escopo emergencial, mas que devem ser debatidos no futuro.
“Existe essa acumulação porque o Brasil, ao longo dos últimos 25 anos, abriu mão de tributar os seus dividendos. Se eu pudesse apontar apenas um elemento, a isenção de dividendos é um dos fatores que mais distorceram a carga tributária entre pessoas físicas e jurídicas. O Brasil precisa seguir os países que taxam dividendos. Na OCDE, só tem a Estônia, e, de economias importantes, só tem o Brasil”, concluiu.
Abaixo, segue o vídeo com a íntegra do debate.