Auditores e sociedade debatem LOF e reforma tributária
A cidade de Recife sediou na última sexta-feira (12/3) o primeiro dos seminários de 2010 sobre a LOF (Lei Orgânica do Fisco) que terão por objetivo retomar junto aos Auditores-Fiscais de todo o país as discussões iniciadas ano passado sobre direitos, deveres e prerrogativas das autoridades fiscais da Receita Federal do Brasil. Os debates durante o seminário se voltaram para as discussões sobre a necessidade de uma reforma tributária e sobre a urgência de conclusão da minuta da LOF e de seu envio ao Congresso Nacional.
Presente na abertura do evento, o delegado-substituto da DRJ (Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento) Recife, Auditor-Fiscal Manuel de Andrade, reiterou o apoio da Superintendência da 4ª Região Fiscal ao seminário e transmitiu desculpas de representantes da administração local que, por compromissos marcados anteriormente, não puderam comparecer ao debate. Representando a administração, também esteve presente o inspetor da Alfândega do Aeroporto do Recife, Auditor-Fiscal José de Assis Ferraz.
Ao falar no início do evento, o presidente do Sindifisco Nacional, Pedro Delarue, ressaltou a importância da aprovação da LOF não só para os Auditores-Fiscais, mas para toda a sociedade. “Para oferecermos ao cidadão a plenitude da nossa capacidade de servir, precisamos da garantia de que não seremos perseguidos e pressionados pelos poderes político e econômico. Esse é objetivo desse encontro”, defendeu Delarue.
Com um auditório lotado de Auditores-Fiscais, estudantes de Direito da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e da Unicap (Universidade Católica de Pernambuco), além de Auditores-Fiscais recém-aprovados no último concurso, o painel “Reforma Tributária: Dificuldades e Perspectivas” teve início com a participação do deputado federal Roberto Magalhães (DEM/PE).
O parlamentar citou algumas frentes em que está atuando, como a dos desafios do pré-sal, deu uma aula de direito constitucional e falou sobre o absurdo da carga tributária existente. “É inadmissível que os mais ricos paguem menos impostos do que qualquer trabalhador brasileiro”, defendeu.
Magalhães defendeu a uniformização da legislação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e o fim da “guerra fiscal” entre os estados; falou sobre a criação futura do IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que poderá conduzir ao desaparecimento do ICMS; e mencionou seu voto contra a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 333/04, que aumenta o número de vereadores dos atuais 51.748 para 59.791.
Durante o debate, o deputado perguntou ao presidente do Sindifisco Nacional, Pedro Delarue, se a renúncia fiscal não deveria ter rígidas normas constitucionais. O Auditor respondeu que, embora a renúncia fiscal, em regra, seja dinheiro no bolso dos ricos, ela pode ser também um mecanismo de estímulo, como foi o caso da desoneração do IPI durante a crise econômica mundial. O que falta, na opinião do presidente do Sindifisco, é um maior debate no Congresso sobre as propostas de desoneração feitas pelo governo.
Visão social – Após as considerações do deputado, foi a vez de o presidente do Sindifisco Nacional tecer seus comentários sobre reforma tributária. “Antes de pensar em reforma constitucional, devemos acabar com a fórmula perversa pela qual apenas cinco mil pessoas físicas declaram ganhar mais de um milhão por ano. Sabemos que tem muito mais gente que ganha mais de um milhão, mas é isento de IR, pois é sócio de pessoa jurídica. Outros, mesmo sendo pessoas físicas de fato, constituem-se como pessoa jurídica, já que a carga tributária da PJ é menor”, avaliou.
Além desse caso, o sindicalista deu mais exemplos de situações que geram o sentimento de aversão tributária no contribuinte, como o caso de donos de jatinhos particulares e de lanchas, que não pagam IPVA (Imposto sobre Veículos Automotores). “Enquanto o trabalhador vai para o trabalho no seu carro ‘mil’, onerado pelo IPVA, o chefe passa acima dele, no seu helicóptero isento de IPVA”, ponderou.
Exemplificando mais ainda os danos causados aos bons contribuintes, Delarue citou o Refis (Programa de Refinanciamento de Dívidas Fiscais) e a repatriação de capitais estrangeiros. “Há 500 anos, os mais ricos transferem sua responsabilidade de sustentar o país aos mais pobres. Enquanto que, nos países altamente desenvolvidos, os mais ricos assumem sua responsabilidade com o país”, afirmou.
O presidente do Sindicato destacou ainda que, enquanto na maior parte dos países, a incidência maior da tributação é sobre o patrimônio e a renda, no Brasil, 65% são sobre o consumo. “Qualquer mendigo nesse país é contribuinte, porque sequer a cesta básica é isenta de tributos. Isso tem que mudar, mas falta vontade política”, defendeu Delarue.
Ele ainda informou que estão sendo feitos vários estudos técnicos pelo Sindifisco Nacional, como por exemplo, um sobre o IPVA e outro sobre a verdadeira reforma tributária de que o país precisa. “Quando nossos estudos estiverem concluídos, eles serão entregues aos presidenciáveis e à imprensa para que a discussão seja levada à sociedade”, antecipou.
Outro ponto defendido pelo presidente do Sindicato como um dos itens importantes na busca por um sistema tributário mais justo foi o debate sobre a criação do Imposto sobre Grandes Fortunas. No entanto, iniciativas nesse sentido, segundo Delarue, têm esbarrado no lobby de setores da sociedade que possuem evidente influência política e poder econômico. “Queremos quebrar o tabu e ter o direito de ao menos debater o tema. Por enquanto, o debate está interditado pelos interesses econômicos e políticos”, denunciou.
Delarue ainda defendeu a volta de um imposto, no estilo da extinta CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), que permita aos Auditores-Fiscais o acesso à movimentação bancária dos contribuintes. “Não defendemos esse imposto com o intuito de arrecadar, mas como mecanismo de combate à sonegação”, explicou.
Por fim, Delarue citou que quando os Auditores-Fiscais fazem estudos sobre seguridade social e comércio exterior, por exemplo, estão voltando seu potencial a favor da sociedade. “Temos muitas propostas para oferecer, mas temos que ter espaço para discussão”, concluiu.
Visão educacional – Auditor-Fiscal há 25 anos e também professor de Direito Tributário, Zenaldo Loibman foi o palestrante do painel seguinte. Ele convidou os participantes a refletirem sobre um novo modelo de administração tributária que torne o cidadão comum um aliado. “A LOF deve interessar à sociedade brasileira, não versar só sobre a carreira dos Auditores”, afirmou.
O professor usou a célebre frase “mocinho é mocinho, bandido é bandido”, do filme “Lúcio Flávio, o passageiro da agonia” sobre o bandido carioca Lúcio Flávio Vilar Lírio, para propor que um dos paradigmas adotados pela administração tributária seja a de ser “mocinho” sempre.
O Auditor exemplificou ainda a relação Fisco versus contribuinte como uma relação de gato e rato, em que o paradigma tinha que ser mudado do “perde-perde” para o “ganha-ganha”. A ideia seria o contribuinte enxergar como ele lucra com uma administração tributária de alta eficiência, de boa-fé e objetiva.
“A administração tributária não ganha nada em arrecadar por arrecadar. É preciso que seja celebrado um contrato com a sociedade, com metas que conduzam a progressivas desonerações”, defendeu o Auditor.
O professor terminou sua intervenção no debate elogiando o Sindicato. A programação da manhã terminou com o presidente da DS (Delegacia Sindical) Recife, José Maria Luna, reforçando a necessidade de participação dos Auditores-Fiscais no seminário sobre a LOF que será realizado em Brasília, próximo dia 7 de abril, no auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados. Também fez parte da mesa a diretora-adjunta de Assuntos Jurídicos da DS/Recife, Elisabete Ferraz de Sá Barreto.