Poder decisório: a essência do cargo de Auditor-Fiscal

Tomar decisões nem sempre é fácil. Especialmente se envolve riscos. Entre duas ou mais opções, há quem, por medo de fazer a escolha errada, aprisiona-se na dúvida; ou, simplesmente, renuncia à capacidade de decidir, recluindo-se no conforto da subordinação voluntária. Essas possibilidades não existem para o Auditor-Fiscal. O poder decisório é a essência do cargo. Dele, não se pode fugir.
Contudo, por problemas culturais ainda fortemente arraigados na instituição – alimentados pela possibilidade legal de exercer, em caráter geral, as “demais atividades” inerentes à competência da Secretaria da Receita Federal, conforme a Lei 10.593/2002 – muitos Auditores-Fiscais se esquivam de atribuições decisórias. Optam por distanciar-se, cada vez mais, da responsabilidade de decidir, enquanto assistem, inertes, à transferência ilegítima de tais competências a outros Auditores-Fiscais, ocupantes de função.
Insegurança e comodismo de um lado. Tendência centralizadora de outro. O resultado dessa equação é a concentração do poder decisório em cargos de chefia e direção. Determinadas competências decisórias tornaram-se, ao longo dos anos, exclusivas dos ocupantes dessas funções, que, por sua natureza, estão muito mais vulneráveis a pressões externas e ingerência política. Terreno fértil para a deterioração do sistema tributário, para a fragilização da Receita Federal e para contestações à autoridade fiscal representada pelos Auditores.
Esse fenômeno, na prática, não raro logrou transformar Auditores-Fiscais em meros pareceristas, a serviço de outros Auditores-Fiscais. É como se um juiz redigisse a sentença para outro juiz assinar. Criaram-se, entre pares, níveis hierárquicos diferentes, em flagrante desrespeito ao ordenamento jurídico. Auditores-Fiscais que optam pela indiferença diante dessa situação, além de compactuar com um cenário de ilegalidade, contribuem para sua própria desvalorização, bem como de toda a classe e da instituição.
Reverter essa tendência é uma obrigação moral e legal de cada Auditor-Fiscal. Passou da hora de assumir, plenamente, a autoridade e o poder decisório que o legislador atribuiu ao cargo. Isso significa decidir, e não propor para outros decidirem. Este chamamento é direcionado a todos os integrantes da classe, inclusive àqueles em postos de chefia e na cúpula do órgão.
A revogação dos atos normativos infralegais que usurpam as prerrogativas relacionadas ao poder/dever de decidir dos Auditores-Fiscais é condição sine qua non para blindar a instituição de ataques espúrios e restabelecer o seu prestígio na sociedade e no âmbito da administração pública. Enquanto não há uma sinalização definitiva da cúpula, compete aos chefes das unidades descentralizadas implementar, por meio de portarias locais, o processo de desconcentração, devolvendo as competências decisórias aos demais Auditores-Fiscais. Essa é a essência do cargo e o que justifica a sua natureza de carreira típica de Estado, fundamental para o desenvolvimento da nação.