PGR reafirma inconstitucionalidade do fim do voto de qualidade no Carf

O procurador-geral da República, Augusto Aras, considerou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6403), proposta pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), contra o fim do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Assinada pelo ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior Eleitoral Gilson Dipp, a ADI foi idealizada durante reunião de dirigentes do partido com diretores do Sindifisco Nacional. Em junho deste ano, o Sindifisco Nacional foi admitido como amicus curiae na ação. 

O objetivo da ADI é declarar inconstitucional o artigo 28 da Lei no 13.988/2020, que inseriu o artigo 19-E na Lei no 10.522/2002, estabelecendo novo critério para desempate dos julgamentos ocorridos no âmbito do conselho, favoravelmente ao contribuinte. O parecer da PGR foi apresentado ao ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello.

O fim do voto de qualidade no Carf foi inserido na lei via emenda parlamentar, durante a tramitação da MP 899/2019, a chamada MP do Contribuinte Legal. A emenda foi apresentada diretamente em plenário, sem ter passado pela Comissão Mista do Congresso Nacional, que discutiu todas as emendas relativas à referida Medida Provisória.

Em abril, a própria PGR ajuizou uma ação (ADI 6399) questionando a constitucionalidade do artigo 28, em razão do que é conhecido no Brasil por “contrabando legislativo”: a inserção de dispositivos que não tenham pertinência temática com a norma original, infiltrando no sistema jurídico normas que venham a causar mudanças não devidamente debatidas no âmbito legislativo.

De acordo com a ADI, não haveria pertinência temática entre a emenda e a MP, o que violaria o princípio democrático e o devido processo legal assegurados pela Constituição. Na ação, o PSB defende ainda que, com a alteração, o Carf passaria a ter um caráter privado, com poder decisório soberano aos representantes dos contribuintes, indicados por entidades privadas, resultando em perda de arrecadação de cerca de R$ 60 bilhões por ano.

O parecer de Augusto Aras assinala que “na redação original, a MP 899/2020 tratou de transação em matéria tributária, envolvendo os créditos tributários já em fase de execução – portanto já constituídos e exigíveis”, enquanto a emenda parlamentar “alterou a forma de atuação de órgão colegiado disciplinado por legislação específica, cuja função é apreciar recursos em processos administrativos tributários”.

Para o procurador-geral da República, “a ausência de afinidade temática com a matéria inicialmente tratada na MP 899/2020 implica violação do princípio democrático e do devido processo legislativo”. Além disso, a emenda trata da organização e do funcionamento de órgão da administração pública disciplinado por lei específica, matéria reservada ao presidente da República.

Em setembro deste ano, o Sindifisco Nacional denunciou o fim do voto de qualidade à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e ao Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi). Para a entidade, a alteração legislativa tende a comprometer o combate à sonegação fiscal, evasão de divisas, corrupção, lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, entre outros crimes financeiros.

Conteúdos Relacionados