Ministro Bruno Dantas promove “fake news” e ofende Receita Federal
Não se pode duvidar das qualificações técnicas e da envergadura intelectual de um ministro do Tribunal de Contas da União. A Constituição – ao estabelecer que os ocupantes do cargo devem ter, além de idoneidade moral e reputação ilibada, notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública – não deixa margens para questionar tais atributos.
Isto posto, não é difícil entender por que a reação do ministro Bruno Dantas a uma correspondência da Receita Federal – um pedido de informação para subsidiar um processo em que outra pessoa era fiscalizada – chocou os Auditores-Fiscais e todos os que compõem a instituição.
Acreditando enganosamente ser a correspondência um aviso de auditoria sobre os seus próprios rendimentos, o ministro desatou a proferir impropérios contra a Receita Federal, dizendo-se vítima de retaliação e perseguição do órgão. A uma solicitação para esclarecer situação relativa a terceiro contribuinte – um profissional médico de quem uma dependente sua fora cliente -, Dantas reagiu com inusitada agressividade.
De plano, salta aos olhos o desconhecimento do ministro acerca do trabalho da Receita. A correspondência por ele recebida é expediente absolutamente prosaico e cotidiano no órgão. Qualquer administração tributária do mundo lida diariamente com o procedimento de “circularização” – que nada mais é do que um pedido de informação do Fisco a um contribuinte, buscando dados de um terceiro, este sim o contribuinte fiscalizado, para que a apuração fiscal seja conduzida de maneira justa e escorreita.
A Receita esclareceu que a mesma correspondência fora direcionada a outras 56 pessoas físicas. “O objetivo dos pedidos de informações aos clientes, nesses casos, é algo absolutamente normal e se destina a verificar se este contribuinte prestador de serviços médicos declarou todos os pagamentos recebidos de seus clientes”, ressaltou o órgão em nota.
Ademais, o ministro julga mal a índole e a inteligência dos Auditores-Fiscais. Acreditar que um Auditor da Receita Federal teria a iniciativa de retaliar um ministro da Corte de Contas da União – ainda mais utilizando para isso um pagamento de valor irrisório (R$ 13 mil) -, é algo que beira o surrealismo. Tal “fake news”, de que o ministro teria sido alvo de retaliação e constrangimento, foi reproduzida por diversos órgãos de imprensa e repetida, naturalmente sem se dar conta, até pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, no Twitter e no programa Roda Viva, da TV Cultura, na última segunda-feira.
Ainda que a desinformação acerca do trabalho da Receita Federal possa ser ressalvada, o que mais causou espanto nesse episódio foi justamente o tom agressivo das declarações do ministro à imprensa. Sem buscar previamente informações junto ao órgão, Dantas afirmou ao Estadão: “Tenho consciência pública suficiente para separar a instituição da Receita de alguns poucos marginais que se instalaram nos subterrâneos do órgão”. À Folha de São Paulo, disse: “Não confundo a instituição Receita com a atuação de meia dúzia de marginais que podem estar instalados no esgoto da Receita”.
Se o ministro acredita que há marginais na Receita Federal, daria uma grande contribuição ao país se pudesse nominá-los ou fornecer indícios de quem são. Face à responsabilidade institucional de que está investido, levantar suspeitas genéricas sobre um órgão de profissionais sérios e comprometidos macula a imagem de toda a instituição.
A reação precipitada e emocional permite vislumbrar o ânimo do ministro e preocupa os Auditores-Fiscais, pelo fato de ser ele o relator, no TCU, de todos os assuntos envolvendo a Receita Federal nos anos de 2019 e 2020. O Sindifisco Nacional espera que diante do esclarecimento irrefutável de que não sofreu nenhum tipo de retaliação ou constrangimento, o ministro Bruno Dantas venha a público e se manifeste sobre seu equívoco, de forma a preservar a relação institucional que deve existir entre importantes órgãos da República.