Lei que implementa novas regras de perdimento aduaneiro é sancionada pelo governo

Foi sancionada pelo presidente da República em exercício, Geraldo Alckmin, na quinta-feira (24), a Lei nº 14.651/2023, que altera sobretudo o Decreto-Lei nº 1.455/1976, responsável por definir, dentre outros temas, os procedimentos afetos à imposição de perdimento de mercadorias por dano ao erário decorrente de infrações aduaneiras.

A partir de agora, de modo análogo ao que ocorre com a imposição de penalidades via lavratura de auto de infração na área de tributos internos, regida pelo Decreto nº 70.235/1972, a aplicação da pena de perdimento de mercadorias, veículos e moeda passa a ser realizada diretamente pela autoridade aduaneira, Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil. “Isso é um enorme ganho para a categoria, um empoderamento do Auditor que vai aplicar essa penalidade”, afirmou o diretor de Estudos Técnicos do Sindifisco Nacional, Auditor-Fiscal Gabriel Rissato.

Anteriormente, a competência para aplicar a penalidade, disposta no Decreto-Lei nº 1.455/1976, era do ministro da Fazenda em instância única, que delegava tal incumbência, geralmente via Regimento Interno da Receita Federal, para os titulares de Alfândegas e Delegacias. “Essa competência, assim, ficava na mão de alguns poucos Auditores, concentrando o poder decisório”, esclareceu Rissato. “Com a alteração, o auto de infração da autoridade fiscal que versa sobre perdimento aduaneiro passa a não ser mais uma propositura, mas sim uma efetiva aplicação da pena, replicando o que ocorre com as demais penalidades sujeitas ao rito do processo administrativo fiscal.”

De acordo com a Lei nº 10.593/2002, é atribuição privativa dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil a constituição do crédito tributário mediante o lançamento. “O procedimento fiscal culmina na atividade do lançamento, que constitui efetivamente o crédito tributário, gerando a imposição ao contribuinte de pagamento de tributo e/ou multa”, explicou Gabriel Rissato. Na esfera federal, o procedimento fiscal é regido pelo Decreto nº 70.235/1972, recepcionado pela Constituição de 1988 com força de lei. Segundo ele, o auto de infração será lavrado por uma autoridade competente, que o Decreto nº 7.574/2011, ao realizar o cotejo com a Lei nº 10.593/2002, elenca como sendo o Auditor-Fiscal.

Conforme a Portaria RFB nº 20/2021, que trata dos atos administrativos no âmbito do órgão, é possível notar que vários atos são carregados de poder decisório. “Temos dois atos decisórios específicos, o auto de infração e a notificação de lançamento, que são privativos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, e se prestam a constituir o crédito tributário. Se estivermos tratando apenas de tributo, lavra-se a notificação de lançamento, enquanto a imposição, conjunta ou isolada, de penalidade, é feita via auto de infração”, acrescentou.

“Ao regular o instituto do perdimento aduaneiro via Decreto-Lei nº 1.455/1976, criou-se um rito separado da regra geral do Decreto nº 70.235/1972, o que permitiu, inclusive, a esdrúxula situação de termos um Auditor lavrando auto de infração e aplicando perdimento para o IPI (tributo interno), enquanto outro lavrava o mesmo instrumento, mas apenas propunha o perdimento na seara aduaneira”, ressaltou Rissato. “E isso também gerava uma quebra de isonomia no tocante ao contencioso, pois a impugnação do perdimento do IPI, tal qual as multas em geral, era julgada por colegiados via DRJ e, depois, CARF, enquanto a do perdimento aduaneiro estava sujeita ao julgamento de apenas uma autoridade fiscal, que titularizava a unidade.”

Além de afrontar comando da Lei nº 9.784/1999, que preceitua a obrigatoriedade de ao menos duas instâncias administrativas de julgamento, o regramento antigo também descumpria acordos internacionais, sobretudo a Convenção de Quioto de 1999, promulgada pelo Decreto nº 10.276/2020, que também prevê duas instâncias recursais administrativas para julgar infrações aduaneiras. “De modo semelhante ao que temos no restante das penalidades, é necessário garantir ao contribuinte o exame do pleito por uma autoridade diferente da que aplicou a pena. Com as mudanças da Lei nº 14.651/2023, passaremos agora de uma instância única para um sistema de duas instâncias, que serão reguladas por ato do Ministério da Fazenda e muito provavelmente estarão dentro da Receita Federal”, destacou Rissato.

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