Font: proposta de reforma do Sindifisco marca turno da tarde

O Fórum Nacional Tributário, realizado pelo Sindifisco Nacional no Hotel Royal Tulip Alvorada, em Brasília (DF), trouxe no período da tarde dois painéis que discutiram o tema “simplificação tributária na prática” e questionaram os porquês de as reformas tributárias fracassarem.

Antes dos debates, o novo subsecretário-geral da Receita Federal, Auditor-Fiscal José de Assis Ferraz Neto, parabenizou o Sindifisco pela realização do evento, que considerou “oportuno” por tratar de um tema proeminente na agenda do país. “Hoje nós fomos presenteados com discussões extremamente relevantes”, disse. O subsecretário enfatizou que pela primeira vez a Receita também poderá apresentar um projeto de reforma tributária, que será encaminhado nos próximos dias ao Congresso Nacional. “É um sistema que a gente precisa construir de maneira a conseguir trazer previsibilidade, ter um ambiente empresarial mais tranquilo, mais seguro, com uma segurança jurídica maior (…) e a Receita Federal tem um papel importante nesse processo”, exclamou.

No primeiro painel, a Auditora-Fiscal da Receita Federal Simone Maia Covre fez uma explanação sobre o Projeto Nota Fiscal de Serviço Eletrônica (NFS-e), desenvolvido pela Receita para tornar mais simples a gestão fiscal das empresas. A iniciativa, tratada no âmbito legislativo pelo Projeto de Lei Complementar 521/18 – na Câmara dos Deputados – propõe um sistema tributário com informações, sistemas e legislações integradas, mediante a manutenção de uma nota eletrônica de padrão nacional, um ambiente de dados também nacional e um Comitê Gestor centralizado.
 
Segundo Simone Maia, o sistema já está pronto e sua implementação depende da adesão dos municípios, que, pela proposta, não teriam nenhuma perda de arrecadação. “Nosso objetivo aqui é simplificar a vida do contribuinte e não limitar a atuação municipal”, explicou. A Auditora demonstrou o funcionamento do projeto, na prática, e afirmou que a NFS-e foi pensada de forma a adaptar-se a eventuais mudanças legislativas. “A estrutura tecnológica atende a qualquer reforma tributária que vier a ser concretizada”, declarou.
 
Em seguida, o empresário Miguel Abuhab apresentou um plano de alteração do sistema tributário desenvolvido por ele, com base na Teoria da Restrições – “para melhorar o todo, não precisa mudar tudo” – e na Ortodoxia – “fazemos, não sabemos porque fazemos mas continuamos fazendo”. Seguindo estas premissas, Abuhab disse que bastariam mudanças pontuais para se alterar todo um conjunto de entraves e burocracia do atual sistema tributário.
 
O empresário propõe a criação de comitês gestores nacional, estaduais e municipais, que seriam responsáveis por gerir o imposto único – Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) – mas com a novidade de funcionamento “em regime de caixa”. Pela proposta, parte dos impostos passaria a ser cobrada automaticamente dos contribuintes, pela circulação de mercadorias e via recolhimento dos bancos. “A tecnologia permite que os impostos sejam apurados pela circulação do dinheiro e recolhidos pela movimentação no sistema bancário”, sugeriu.


 
Reformas – Na abertura do painel “por que as reformas tributárias fracassam?”, mediado pelo desembargador do TRF-4 e professor de Direito e Crimes Financeiros da PUC-RJ, Leandro Paulsen, o economista e atual presidente do Instituto Insper, Marcos Lisboa, criticou a prática da substituição tributária e afirmou que é preciso criar um sistema que torne menos onerosa a carga tributária, especialmente no tocante à tributação de pessoas que são físicas e jurídicas, por meio da redução dos tributos cobrados das empresas.
 
O economista citou que as principais distorções não estão no regime de Lucro Real, mas no Simples Nacional e no Lucro Presumido, e cobrou a adoção, pelo Brasil, da prática internacional de cobrança dos tributos no “destino”, e não na “origem” da cadeia produtiva. Também afirmou que “o imposto não pode distorcer o preço relativo” – comparando, como exemplo, os custos tributários de um arquiteto e de um fabricante de automóvel –, ao defender uma alíquota única para todos os contribuintes, paga por meio do IVA. “Não se faz política pública via tributação de consumo”, concluiu.
 
O Professor titular de Direito Financeiro da USP, Heleno Torres, por sua vez, comentou as propostas de reforma tributária dos últimos anos, que, segundo ele, “fracassaram por falta de consenso”. Disse ter dúvidas sobre o potencial do texto defendido pelo governo (PEC 45/19) de atender aos reais anseios dos contribuintes por simplificação, redução de obrigações acessórias, eliminação de redundâncias e excessos sobre o consumo. Para ele, a maioria dos problemas tributários poderiam ser resolvidos sem emenda à Constituição, por meio de instruções normativas, decretos, leis ordinárias e, no caso do ICMS, por lei complementar.
 
Torres classificou a PEC 45 como um “desastre” porque não institui, de fato, as mudanças mais necessárias, como a criação da alíquota única. Neste ponto, o mediador do painel, desembargador Leandro Paulsen, criticou o longo prazo estipulado pela PEC como regra de transição – que chega a 50 anos – ao alertar que a regra pode trazer ainda mais complexidade ao fisco brasileiro, devido à possibilidade de dois sistemas paralelos vigorarem durante muitos anos. “Vejo um cenário ruim para empresas e profissionais da área”, lamentou.
 
Por fim, Heleno Torres também contestou a tributação na origem e afirmou que as discussões sobre a reforma tributária devem encarar o problema da tributação sobre o consumo, da alta contribuição sobre a folha de pagamento e, ainda, descartar a possibilidade de tributação sobre as movimentações financeiras. O consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Marcelo Sobreiro Maciel, também integrante do painel, fez uma leitura das propostas de reformas dos governos Collor/Itamar, FHC e Lula, apontando os diversos fatores que levaram os projetos a fracassarem, como a aversão a risco – por parte dos governantes –, a estabilidade econômica e a fragmentação do empresariado.


 
Proposta Sindifisco – O fórum foi encerrado pelo presidente do Sindifisco Nacional, Kleber Cabral, que apresentou ao público a proposta de tributação sobre a renda elaborada pelo sindicato. Como contexto, o Auditor-Fiscal apontou os principais desafios estruturais à reforma tributária – sonegação; extinção da punibilidade dos crimes contra a ordem tributária; programas de refinanciamento (Refis/Pert); contencioso administrativo fiscal e desonerações – e explicou que a redução da carga, uma maior justiça fiscal e a “simplificação num passe de mágica” são meras ilusões sobre as proposições em curso na Câmara (PEC 45) e no Senado (PEC 110/19).
 
O presidente explicou que o estímulo à chamada pejotização – em função das benesses concedidas aos optantes do Simples Nacional e do regime de Lucro Presumido – geram “erosão na base tributária”, desorganização do mercado de trabalho, concorrência desleal e perda de arrecadação. “Isso faz com que o Brasil, para determinadas empresas, seja um verdadeiro paraíso fiscal”, observou Kleber Cabral, em referência aos limites de faturamento de R$ 4,8 milhões e R$ 78 milhões para adesão aos dois regimes tributários, respectivamente.
 
Com base em um estudo do Ipea, de 2017, o Auditor demonstrou que a maior tributação sobre o consumo – e não sobre a renda – faz com que quem ganha até dois salários mínimos paguem 48,8% de impostos enquanto os mais ricos chegam a pagar somente 9% sobre tudo o que ganham. Para corrigir essa distorção, o Sindifisco apresentou sua proposta, em cinco pontos, que tratam do fim da dedução dos juros sobre capital próprio; da tributação de lucros e dividendos das empresas (dentro do país e sobre as remessas ao exterior); da integração entre os impostos de pessoas jurídicas (IRPJ) e físicas (IRPF) e da redução das alíquotas do IRPJ (de 15+10% para 11+6%).
 
A integração entre IRPJ e IRPF se daria, segundo Kleber Cabral, por imputação na modalidade “inclusão parcial”, que permitiria tributar lucros e dividendos na fonte – 70% para ganhos acima de R$  50 mil. Todas as medidas, somadas a uma correção de 70% da defasagem histórica da tabela do IRPF, resultaria num incremento anual de arrecadação superior a R$ 13 bilhões.
 
Ao fim da explanação, o presidente do Sindifisco voltou a afirmar que “não adianta ter o melhor modelo [tributário] se as pessoas não o cumprem”, ao defender penas mais duras para os sonegadores e o fortalecimento da administração tributária e do cargo de Auditor-Fiscal. O anfitrião agradeceu a presença de todos os participantes do primeiro Fórum Nacional Tributário e reforçou o caráter propositivo do sindicato perante as pautas macroeconômicas em curso no Brasil. “O Sindifisco cumpre, com isso, seu desejo de colaborar com discussões que são tão relevantes para o país, que são tão relevantes pra sociedade”, finalizou Kleber Cabral.

 

 

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