Análise da minuta da Lei Orgânica encerra seminário

A segunda etapa do seminário “A Receita Federal para um Brasil mais justo”, realizado em Aracaju, na última sexta-feira (30/4), foi destinada à análise da minuta de LOF (Lei Orgânica do Fisco) entregue pela administração às entidades. 

Para o presidente do Sindifisco Nacional, Pedro Delarue, a minuta traz avanços, mas também erros conceituais e omissões. O sindicalista apontou o erro logo na ementa que anuncia: “Dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto da Secretaria da Receita Federal do Brasil e dos seus servidores”. Para ele, uma lei orgânica tem sim que dispor sobre os servidores da Receita, mas não pode fazer deles uma tábua rasa. O mais certo, segundo Delarue, seria separar quem é autoridade dentro do órgão.

Em relação ao artigo 3º, inciso III, Delarue defendeu que a função de “planejar, dirigir, supervisionar e executar” o lançamento do crédito tributário – que é um ato específico, individual e exclusivo dos Auditores-Fiscais – deve constar apenas no art. 20, no qual estão elencadas as atribuições do cargo.

Outro erro, segundo ele, estaria na redação do artigo 6º que diz que o Auditor tem direito à prisão especial ou em sala especial de Estado Maior. “Não tem que haver essa opção de prisão especial, pois essa condição é prevista a todos que têm curso superior. É questão de garantir a vida dos que lidam com contraventores, evitando colocá-los junto com aqueles que contribuíram para prender”. Ele entende que a subtração da conjunção “ou” é primordial. “O texto correto seria ‘direito à prisão especial em sala especial de Estado Maior, à disposição…’”, avaliou.

Para Delarue, o artigo 7º mostra o quanto a prerrogativa de acesso é imperiosa, uma vez que ela dá o direito à permanência, inclusive com veículo, em locais restritos, bem como de livre acesso, trânsito, circulação, parada e permanência em quaisquer vias públicas ou particulares, ou recintos públicos, privados e estabelecimentos.

O presidente do Sindicato citou o problema que está ocorrendo em São Paulo, onde a administração quer exigir o uso do crachá. “Não é implicância com o crachá. Mas o Estado confecciona uma carteira funcional e diz que ela é sua identidade. Depois vem outra norma, obrigando o uso do crachá, como se isso fosse uma identidade à parte e mais importante. Fica difícil atender ao entendimento do ‘síndico do prédio’”.

Acerca do processo disciplinar, o presidente do Sindifisco vê como absolutamente inadequada a redação do artigo 117, da Lei 8.112/90, que diz “proceder de forma desidiosa”. Na avaliação dele, este termo é altamente subjetivo e, na prática, permite a demissão por, supostamente, qualquer ato, o que somente se presta a fragilizar a autoridade do ocupante do cargo. “O Auditor não pode ficar sujeito a um possível arbítrio dentro de um processo administrativo”, defendeu.

Vitaliciedade e inamovibilidade – Outras duas polêmicas dizem respeito ao pleito dos Auditores de vitaliciedade e inamovibilidade. “Acho complicado conseguirmos convencer o poder Executivo. Mas entendemos que isso não é reserva constitucional e pretendemos buscar um embasamento jurídico para tal convencimento”, afirmou.

Outro ganho destacado por ele foi a exclusividade dos recursos do Fundaf (Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização) para o órgão. “Brigamos por isso durante anos”, relembrou.

No capítulo referente à organização, o presidente do Sindifisco entende que é preciso explicitar que são os Auditores que compõem o Conselho Superior de Administração Tributária e Aduaneira; e são os titulares do Conselho de Ética; da Corregedoria-Geral; da Ouvidoria-Geral; da Auditoria Interna; das Adidâncias Tributárias e Aduaneiras e das Unidades Descentralizadas.

O sindicalista também voltou a defender a separação dos cargos que integram a carreira Auditoria. “Ainda que o representante da Casa Civil tenha dito aqui que [a comunicação dos cargos] é  inconstitucional, mas difícil de mudar, e que ninguém tem coragem de tocar nesse vespeiro, esse é um ponto que vamos brigar até o final, posso garantir”, antecipou. O sindicalista informou que o Sindicato vai entrar com uma ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) para separação dos cargos em carreiras distintas.

Delarue também criticou o artigo 18 da minuta que diz que "a Carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil, típica e exclusiva de Estado, é integrada pelos seguintes cargos, de nível superior, distintos e incomunicáveis entre si: Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil". “Como é que uma carreira que tem como atribuição auxiliar o Auditor pode ser carreira típica de estado?”, questionou. Para provar que a redação é um equívoco, o sindicalista lembrou que a atividade de fiscalização é que é exclusiva de Estado, mas que não é desempenhada pelo Analista-Tributário.

Autoridade administrativa – Delarue entende que também é necessário esclarecer no artigo 20 que a expressão “autoridade administrativa” se refere à “autoridade administrativa fiscal”, que, conforme define o art. 142 do CTN (Código Tributário Nacional), é a “autoridade do Poder Executivo (Administração Pública) com a atribuição legal de constituir o crédito tributário", ou seja, o Auditor-Fiscal.

Para o presidente do Sindifisco, outra correção necessária diz respeito ao artigo 22, incisos I (lavrar termo de revelia e de perempção) e III (analisar pedido de retificação de documento de arrecadação), que não deveriam constar das atribuições dos Auditores-Fiscais, pois não são atividades próprias ou que devem ser exercidas pela autoridade fiscal, e sim pelo pessoal de apoio.

O fato de a minuta abrir uma brecha para que o cargo máximo da Receita, o de secretário, seja ocupado por alguém de fora da carreira, livremente nomeado pelo presidente da República, também foi alvo das críticas de Delarue. Para ele, é fundamental que um órgão de Estado esteja livre de ingerências indevidas, sendo é indispensável que o cargo de secretário seja privativo de Auditor-Fiscal.

Além disso, na avaliação dele, é absolutamente necessário que a nomeação e exoneração não sejam livres – conforme consta deste artigo. "O dirigente administrativo máximo do órgão deve ser escolhido entre os seus pares, os Auditores-Fiscais, que devem possuir a prerrogativa de votar e serem votados em lista tríplice para escolha dos principais cargos de administração do órgão. E, devem ser definidos mandatos, com prazos determinados, a fim de conferir liberdade de atuação, autonomia e independência para o exercício do cargo", defendeu.

O presidente do Sindifisco Nacional concluiu sua análise reafirmando que os avanços da minuta não podem ser ignorados, assim como não podem ser ignorados os erros passíveis de correção. “De toda forma, o que não podemos é virar as costas e abandonar a discussão. Temos que lutar para manter o que entendemos que é bom e modificar o que for ruim", finalizou.

Segundo palestrante – O segundo painelista da tarde foi o ex-secretário da Fazenda de Sergipe, Auditor-Fiscal Nilson Nascimento Lima, que elencou alguns objetivos a serem alcançados com uma lei orgânica, como tornar os órgãos da administração tributária autônomos, impessoais e conduzidos em sintonia com a legislação em vigor e com os ideais de justiça fiscal.

Chamando a atenção para o fato de que ainda não conhecia a minuta proposta pela administração, Lima colocou alguns pontos que, para ele, deveriam constar nela, como a liberdade de julgamento e reconhecimento expresso de que o Auditor é autoridade do órgão. Na avaliação do ex-secretário, a LOF deve servir à Administração Tributária, sociedade, governos e, para isso, o foco tem que estar na qualificação dos Auditores.

Lima reiterou que a política tributária deve sim ser feita em conjunto entre os poderes Executivo e Legislativo. Mas, na sua avaliação, o fato de o secretário da RFB só poder ser um Auditor-Fiscal não limita a atuação do governo. “Na Secretaria da Fazenda, só pode ser Auditor, na Procuradoria, só pode ser Procurador, por que na Receita não seria um Auditor?”, concluiu.

O ex-secretário da Fazenda finalizou sua participação dizendo que os seminários organizados pelo Sindifisco estão atraindo os setores corretos para mostrar que mais do que corporativismo, o que os Auditores querem é a proteção da sociedade.

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