Conselho Consultivo sem Auditores espelha omissão da alta administração
Esta semana, foi publicada a Portaria RFB 1508, assinada pelo secretário especial Marcos Cintra, instituindo o Conselho Consultivo sobre Administração Tributária e Aduaneira da União. O referido conselho será composto pelo próprio secretário, que o presidirá, e por advogados e tributaristas por ele convidados. Cabe ao conselho opinar sobre matérias pertinentes ao aprimoramento da Administração Tributária e Aduaneira, a exemplo da promoção da conformidade tributária e o aperfeiçoamento do contencioso administrativo.
A necessidade de discussão de temas relevantes como os listados tem sido apontada pelas nossas entidades de classe há tempos, e especialmente pelo Sindifisco Nacional desde o início de 2019. Em fevereiro, foi entregue ao ministro Paulo Guedes um breve resumo dos grandes desafios estruturais para o incremento da arrecadação, tratando desses temas e de outros, tais como o necessário incremento do combate à sonegação. Existem gargalos no macroprocesso do crédito tributário que precisam ser enfrentados, e sobre os quais os Auditores-Fiscais tem expertise e total interesse na busca de maior efetividade ao nosso trabalho.
Apesar das tentativas do Sindifisco de pautar esses temas, a alta administração da Receita Federal pouco ou nada construiu a respeito desses assuntos, nem no passado, nem agora. Em 2018, por exemplo, a Receita sofreu um revés quanto à cobrança administrativa especial, graças à atuação da PGFN, que conseguiu reduzir o prazo previsto para inscrição em Dívida Ativa da União. A medida reduziu a eficiência da cobrança administrativa e trouxe maior ônus aos contribuintes, com encargos legais de 10% sobre o crédito tributário apurado pela Receita Federal. Mudou o Governo, e esse assunto jamais foi priorizado. Essa omissão vem custando caro. Como se sabe, não existe vácuo de poder.
Salta aos olhos que a composição do referido conselho consultivo não contempla os Auditores-Fiscais, mas tão somente representantes com visões externas ao órgão. Não devemos ser refratários a debater temas tributários e aduaneiros de amplo alcance econômico e social com representantes da sociedade, profissionais de outros segmentos, que, teoricamente, podem somar na discussão. A disposição ao diálogo é salutar, ainda que saibamos que há um potencial conflito de interesses, já que parcela dos advogados tributaristas acabam naturalmente ganhando com a litigiosidade, com a complexidade, com a ineficiência da cobrança, e com um contencioso lento.
Mas formar um conselho consultivo exclusivamente com advogados e tributaristas, para opinar sobre matérias concernentes à administração tributária e aduaneira, sem a participação de Auditores-Fiscais, é medida contraditória e esdrúxula. Se o intento é buscar o aperfeiçoamento da máquina tributária federal, é incompreensível a exclusão daqueles que, por serem os responsáveis por movimentar as engrenagens dela, mais a conhecem.
Essa iniciativa, justamente em um momento conturbado pelo qual passa a Receita Federal – com interferências vindas do STF, do TCU, ameaças de alteração em sua estrutura -, chegou como um soco no estômago dos Auditores-Fiscais, e deve ser de plano rechaçada.
O outro conselho, criado pela Portaria RFB 1507, para opinar sobre reforma tributária, nos parece totalmente extemporâneo, uma vez que o Governo, segundo anunciou à imprensa, deve divulgar sua proposta de reforma tributária a qualquer momento. Tal iniciativa faria sentido há seis meses, mas não agora. Importante salientar que a composição desse conselho padece do mesmo vício que o anterior, composto exclusivamente por economistas e tributaristas a serem escolhidos pelo secretário.
O Sindifisco Nacional tem total interesse na construção de um diálogo saudável entre a administração tributária e os contribuintes. Vale lembrar que o tema do Congresso Luso Brasileiro de Auditores Fiscais, realizado em junho de 2019, foi justamente a busca de um “Novo Paradigma na relação Fisco – Contribuinte”.
Entretanto, lacunas e omissões como as citadas na Portaria RFB 1508, em vez de minimizar o fosso entre a Receita e a sociedade, ajudam a aprofundá-lo. O final dessa história todos conhecem, afinal, não se pode continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes.