Artigo – Para manter os interesses dos brasileiros acima de tudo: coragem política!

(*)Paulo Roberto Ferreira
Em julho do ano passado o Governo apresentou a primeira das quatro partes prometidas da sua Reforma Tributária. O projeto de Lei nº 3887/2020 previa a unificação do PIS e da Cofins em uma única Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS) com alíquota de 12%, alinhando o país aos conceitos dos modelos internacionais do Imposto de Valor Agregado (IVA). A ideia defendida se pautava no enxugamento das obrigações por parte das empresas e na promessa de simplificar a complexa legislação desses tributos.
Onze meses depois, agora em junho desse ano, foi apresentada uma segunda parte da Reforma tratando do Imposto de Renda. O PL nº 2337/2021, sob a relatoria do deputado federal e Auditor-Fiscal, Celso Sabino, traz avanços em alguns pontos históricos. Nesse contexto, merecem destaque a volta da tributação de dividendos e a correção da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física.
O Brasil resolveu isentar desde 1995 a tributação na distribuição dos dividendos aos acionistas das empresas. Um estudo publicado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em 2020 aponta que a política de renúncia fiscal adotada pelo país em relação aos dividendos só encontra paralelo na Estônia e na Letônia.
O Sindifisco Nacional, entidade que representa os Auditores-Fiscais da Receita Federal, apresentou na sua cartilha de propostas denominada Tributologia os reflexos negativos a respeito dessa medida. A regressividade que significa maior peso proporcional de carga tributária para quem ganha menos e a pejotização na prestação de serviços por parte das pessoas físicas, acarretando desfalque no caixa e possibilidade de colapso nas contas da Previdência Social estão entre os sintomas dessa política. O equilíbrio proposto no estudo visa a volta da tributação dos dividendos em contrapartida à redução das alíquotas do imposto e da contribuição sobre o lucro, permitindo às empresas reinvestir na capacidade produtiva e gerar emprego e renda.
O estudo ainda mostra que essa inversão da carga tributária abre a possibilidade de uma correção das faixas de isenção na tabela do Imposto de Renda Pessoa Física em até três mil reais, beneficiando cerca de 8 milhões de trabalhadores. O projeto apresentado se alinha a essa concepção e propõe uma correção de 31% na tabela que acumula uma defasagem acumulada de 113,09%, garantindo isenção para quem ganha até 2500 reais por mês com o potencial de beneficiar diretamente até 6 milhões de contribuintes. É mais dinheiro no bolso do povo, dinheiro que vai fazer girar a roda da economia.
É certo que o projeto carece de ajustes em outros pontos, como por exemplo a tributação de alguns fundos, os limites para utilização de desconto simplificado e a tributação dos estrangeiros ou não residentes no país.
Como já era de se esperar a proposta gerou críticas por parte da elite econômica brasileira. Mas nessas horas é que se separam os políticos comuns dos grandes estadistas. O presidente John Kennedy, em seu livro “Perfis de Coragem”, vencedor do prêmio Pulitzer em 1957, já dizia que se quisesse atender à vontade dos seus eleitores, era seu dever colocar os interesses deles, e não os seus, acima de tudo. Se um sistema tributário mais justo é interesse da maioria, chegou a hora de mostrar coragem política!
*Paulo Roberto Ferreira é Auditor-Fiscal da Receita Federal e diretor-secretário do Sindifisco Nacional