Artigo explica como contencioso tributário privilegia os ricos no Brasil

O privilégio concedido aos contribuintes ricos, em detrimento das pessoas físicas “de carne e osso”, é o tema de um artigo extremamente esclarecedor sobre a injustiça fiscal que persiste no sistema tributário brasileiro. O texto, enviado ao Instituto Humanitas Unisinos (IHU), foi escrito pela Auditora-Fiscal da Receita Federal Maria Regina Paiva Duarte, que é presidente do Instituto Justiça Fiscal e integrante da coordenação da campanha Tributar os Super-Ricos, e pelo Auditor-Fiscal – também da Receita – Ricardo Fagundes da Silveira, que é mestre em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
As “pessoas de carne e osso” às quais os autores se referem são a imensa massa de trabalhadores, profissionais liberais e consumidores brasileiros. No centro das críticas feitas por Maria Regina e Ricardo, está, entre outros pontos, o fato de que esses contribuintes, embora dependam da arrecadação e da aplicação dos recursos fiscais em políticas públicas, não contam com representação no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). Por outro lado, representados no CARF, estão “donos de grandes conglomerados, bancos e pessoas muito ricas”.
Esse privilégio concedido a uma elite econômica não se restringe à oportunidade de contestar, na condição de julgados, cobranças e autuações fiscais. É muito pior do que isso, pois, como esclarecem Maria Regina e Ricardo, “não há um único país, exceto o Brasil, em que o setor privado, por meio de suas associações ou confederações, indique julgadores para o processo de revisão administrativa”. Ainda segundo o artigo, o abismo entre a minoria privilegiada e a maioria prejudicada foi ampliado pela perda do voto de qualidade, mediante o artigo 28 da Lei 13.988/2020.
A desigualdade – esclarecem Maria Regina e Ricardo – ocorre nas esferas administrativa e judicial. Prova disso é “a excessiva litigiosidade nacional por parte dos maiores devedores e mais abastados”. Esse fenômeno – informam os autores – está documentado em pesquisas recentes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), da Receita Federal e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Uma característica marcante desse enorme acervo processual é a excessiva morosidade nos julgamentos. A demora decorre, em grande parte, de generosos descontos no valor total a pagar, além de condições muito especiais de parcelamento, que mudam, frequentemente, a configuração dos conflitos levados à Justiça. Tudo isso apenas para os mais ricos, claro.
“Grandes empresas fazem uso estratégico da tramitação do contencioso tributário, o chamado planejamento tributário, como mostra o diagnóstico da RFB e BID”, apontam Maria Regina e Ricardo. “Ainda pode-se considerar a possibilidade de realização de práticas fraudulentas como o esvaziamento patrimonial, que acabam com as possíveis garantias ao crédito tributário”, acrescentam.
No artigo, são analisados números, leis e outros estudos, inclusive uma dissertação de mestrado do próprio Ricardo. Nessa dissertação, o Auditor-Fiscal revelou que, dos R$ 178,9 bilhões julgados favoravelmente à Fazenda em 2017, apenas R$ 6,69 bilhões ingressaram direta ou indiretamente nos cofres públicos por meio de recolhimentos à vista, parcelados ou compensações.
Esses e diversos outros tópicos relevadores acerca da injustiça fiscal presente no sistema tributário brasileiro podem ser conferidos na íntegra do artigo escrito por Maria Regina e Ricardo, acessível neste link.