Arrecadação: enfraquecimento da RFB e desvalorização dos Auditores
A RFB (Receita Federal do Brasil) divulgou na quarta-feira (29/10) o resultado da arrecadação de impostos e contribuições federais do mês de setembro. O número, já esperado pela Classe, demonstra que a arrecadação tributária ficará aquém do que fora estimado para o ano de 2014, comprometendo o fechamento das contas públicas, prejudicando a realização de investimentos necessários ao país e impossibilitando o incremento de recursos em setores fundamentais para o desenvolvimento e para a melhoria das condições de vida do povo brasileiro.
De acordo com a “Análise da Arrecadação das Receitas Federais” produzido pela Administração, a arrecadação atingiu o valor de R$ 90,722 bilhões no mês de setembro de 2014 e de R$ 862,510 bilhões no período de janeiro a setembro de 2014. Em relação a setembro de 2013, houve, em termos reais, uma alta de 0,92%. Já no período de janeiro a setembro o crescimento das receitas não passou de 0,67%.
Os dados ora apresentados permitem concluir que não é mais possível alcançar o aumento de 3,5% na arrecadação, previsto para o orçamento deste ano, mesmo tendo o Governo, por meio da Lei nº 12.996/2014, lançado mão do Refis (Programa de Recuperação Fiscal). Convém reiterar, como feito em editorial publicado no site do Sindifisco Nacional no dia 1º de outubro deste ano, que “iniciativas de refinanciamentos de dívidas tributárias vão na contramão da atuação da Administração Tributária, já que diminuem a percepção de risco do contribuinte, incentivam a sonegação e apequenam o poder do Estado”.
O mais preocupante, no entanto, é que, se nada for feito para resolver esse problema, a situação tende a se agravar ainda mais nos próximos anos! O noticiário econômico tem atribuído o fraco crescimento da arrecadação, cujo declínio pode ser claramente percebido desde 2012, exclusivamente à desaceleração da economia, mas outros problemas têm contribuído para aprofundar ainda mais essa situação. O primeiro deles reside no fato de a RFB ter perdido, ao longo dos últimos anos, o protagonismo nas discussões relacionadas ao estabelecimento da política tributária.
Enfraquecimento da RFB – É de conhecimento público que o processo de desoneração fiscal, implementado de maneira mais significativa a partir de janeiro de 2012, em virtude da edição da Medida Provisória nº 540/2011, foi conduzido pelas secretarias Executiva e de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Na definição dos “critérios” para a seleção dos setores beneficiados com essas desonerações, que, diga-se de passagem, são altamente questionáveis, a RFB exerceu o papel de mero coadjuvante, mesmo sendo o órgão detentor das informações técnicas necessárias para a correta tomada de decisões e de expertise imprescindível para fundamentar a ação dos Poderes Executivo e Legislativo Federal quanto a alterações na legislação tributária. Cumpre ressaltar que somente até setembro deste ano as desonerações tributárias impactaram negativamente as receitas da União em R$ 75,69 bilhões.
Desvalorização – Outro fator que precisa ser analisado diz respeito à falta de valorização das autoridades responsáveis pela arrecadação tributária e pelo combate à sonegação fiscal. Informações divulgadas pela própria RFB dão conta de que mais de 600 Auditores Fiscais se aposentam a cada ano. Entretanto, muito pouco tem sido feito com o fim de reparar essa situação. O fato é que, mesmo ciente da situação, o Ministério do Planejamento tem dificultado a realização de concursos públicos nos últimos anos e, quando autoriza os certames, restringe as vagas a um número muito inferior ao necessário. Em 2013, por exemplo, foram chamados somente 250 novos Auditores para atuar diretamente na Receita Federal, mesmo sendo a demanda superior a mil e havendo outros 274 candidatos aprovados em concurso público e prontos para iniciar suas atividades.
Desmotivação – Por outro lado, a desvalorização do cargo tem contribuído de forma significativa para que os Auditores Fiscais encontrem-se desmotivados. A LOF (Lei Orgânica do Fisco), instrumento que reconhece a função estratégica e essencial da Receita Federal e valoriza o cargo de Auditor Fiscal, prevista pela Lei nº 11.457/07 para ser enviada ao Congresso Nacional em março de 2008, até hoje não foi encaminhada sequer ao Ministério do Planejamento. Além do mais, a defasagem salarial, que é superior aos 30%, mostra outro grave problema, apesar da complexidade das atribuições do cargo e dos riscos envolvidos no desempenho de suas atividades, se comparados com os detentores de cargos equivalentes nos fiscos dos 27 Estados e do Distrito Federal, a remuneração dos Auditores da Receita Federal ocupa apenas a 23ª colocação, sendo inferior, inclusive, à percebida em alguns fiscos municipais.
Apesar de tudo isso, os Auditores Fiscais estão dispostos a colaborar na busca de soluções para a dura realidade que se abate sobre as contas públicas, mas para isso é preciso que o Governo Federal tenha um olhar mais atento para todos os problemas enfrentados pelo órgão responsável pela administração dos tributos federais, criando condições para que seu corpo funcional possa atuar de forma ainda mais efetiva no combate à sonegação e na implementação da arrecadação. Se nada disso for feito, a situação tende a se agravar ainda mais.